Considerações sobre o Sistema Impugnativo e Recursal no Processo Administrativo Paulista Regido pela Lei 13.457/2009

Compliance e Obrigações Acessórias no ICMS
16/03/2021
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Autor: CÉSAR EDUARDO TEMER ZALAF, advogado em Campinas e São Paulo, sócio de Temer Zalaf Advocacia, Pós-Graduado Lato Sensu em “Direito Processual Civil” (PUCCAMP), “Economia e Direito Econômico e Empresarial” (UNICAMP), “Direito da Economia e da Empresa” (FGV), “Direito Tributário” (EPD); Membro da AASP, CESA, e MDA e Juiz no TIT/SP.

 Coautor: RAMON WESLLYN FERRAZ RIBEIRO DOS SANTOS, advogado, formado pelo Centro Universitário UniMetrocamp Wyden, pós-graduando em Direito Público (LEGALE), membro da Comissão de Direito Tributário da OAB Subseção Campinas.

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo tecer considerações acerca do processo administrativo tributário paulista e suas peculiaridades. Delineando especificamente os pecados mais corriqueiramente cometidos acerca da sistemática impugnativa e recursal pertencente ao processo administrativo tributário bandeirante, atualmente regido pela lei 13.457/2009. O tema será abordado em linhas gerais, destacando as transgressões desatenciosas, omissões e atos importantes negligenciados pelos advogados impugnantes, na Defesa do Contribuinte em face ao fisco, bem como nos apelos recursais cabíveis, com base na ampla experiência do autor como juiz do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo – TIT/SP.

Sumário: 1. Introdução. 2. O Processo Administrativo Tributário Paulista. 3. A Defesa. 4. O Recurso Ordinário. 5. O Recurso De Ofício. 6. O Recurso Especial. 7. Considerações Finais. 8. Bibliografia.

 

 

  1. INTRODUÇÃO – A QUESTÃO DOS “PECADOS”

 

O hodierno artigo tem por desiderato atender ao honroso convite formulado pela Comissão de Direito Tributário da OAB/Campinas, para discorrer sobre o tema apresentado pelo autor durante 2º Congresso de Direito Tributário ocorrido na sede da advocacia campineira em 29 de agosto de 2019.

 

A priori, busca-se escrever, “en passant”, sobre Impugnação, Recursos Ordinário, De Ofício e Especial, previstos na Lei 13.457/09, destacando seus requisitos a serem satisfeitos, apontando alguns cuidados a serem sempre tomados e indicando ao final de cada assunto os “pecados processuais” mais comuns observados em cada fase no âmbito do contencioso administrativo tributário.

 

Assim a finalidade é informar e alertar, com base na experiência do autor como juiz do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo, os “navegadores” sobre os cuidados a serem tomados em sua prática.

 

  1. O PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO PAULISTA – PAT/SP

 

O processo administrativo tributário paulista é regido pela lei 13.457/2009, trata-se de um importante instituto cuja finalidade repousa no controle do ato administrativo do lançamento e a liquidação do crédito tributário. Tendo sua criação motivada na busca pela resolução de conflitos de competência tributária estadual de maneira mais célere e menos custosa (pois se tratando de processo administrativo, não há que se falar em pagamento de custas judiciais), tanto para o contribuinte quanto para o próprio fisco.

 

 

 

  1. A DEFESA

 

O processo administrativo paulista, ao contrário do previsto em leis anteriores, só tem início com a impugnação do auto de infração, conforme destacado no artigo 33 da Lei 13.457/2009. O efeito jurídico deste artigo é o de colocar o contribuinte ou responsável impugnante – que se assemelha à figura do réu no processo civil (porque sofre a acusação insculpida no auto de infração) – como responsável pela instalação do PAT (processo administrativo tributário).

 

Essa inversão de papéis, apesar de estranha, atinge uma finalidade muito importante de evitar a lide administrativa senão quando o próprio acusado a provoca, transferindo-lhe essa responsabilidade e presumindo que o silêncio importa em desistência de litigar no âmbito administrativo.

 

No mais, acusador (Fazenda) e defensor (contribuinte ou responsável impugnante) mantém a sua natureza jurídica de autor e réu, respectivamente (na comparação que fiz) especialmente para se preservar a distribuição do ônus da prova.

 

Nesse particular, a distribuição do ônus da prova sofre as mesmas consequências da dialeticidade do processo civil que conhecemos, pois o § 1º do artigo 34 da lei do PAT paulista estabelece que: “O auto de infração deve ser instruído com documentos, demonstrativos e demais elementos materiais comprobatórios da infração”.

 

Com isso, o ônus da prova descrito na acusação é do fisco, devendo este instruir os autos com todos os elementos de prova que a suportam, quando da lavratura do auto de infração. Assim, ao impugnante resta a instrução probatória dentro do prazo de 30 dias a partir da regular notificação da peça acusatória (auto de infração), conforme disciplina o artigo 35 da Lei 13.457/2009.

 

Nota-se que a omissão ou inércia do impugnante de forma total ou parcial em face da acusação, não apresentando sua defesa, representa falta de interesse na contradição das ações infracionais a ele imputadas, tendo como consequência os procedimentos de inscrição na Dívida Ativa do Estado, se não pago o débito exigido, conforme §§ 1º a 4º do artigo 35.

 

Estabelece o artigo 37, em seu caput e §§ 1º e 2º outros requisitos formais e materiais à admissibilidade e ao conhecimento da peça impugnatória. Três aspectos merecem destaque neste artigo: (I) a obrigatória instrução pelo impugnante de todos os documentos comprobatórios de seus argumentos de defesa; (II) a possibilidade de interposição por meio eletrônico e (III) a flexibilidade do aspecto espacial da realização do julgamento.

 

Dentre as recomendações em face de “pecados” a serem evitados pelos contribuintes na sua interposição da peça impugnante, estão as seguintes:

  1. Evitar a perda do prazo desmotivada de 30 dias para interposição da peça;
  2. Destacar em preliminares, possíveis vícios de lavratura do auto-de-infração e, no mérito, apresentar todos os argumentos e fundamentos possíveis, inclusive os de caráter subsidiário, sob pena de não haver o necessário prequestionamento em eventual recurso;
  3. Apresentar todas as provas na defesa. Não se esquecer que o ônus da acusação é do fisco;
  4. Preliminares em excesso e protelatórias desviam o foco do julgador das questões relevantes;
  5. Não pedir pela produção de prova pericial (não há previsão legal para isso) mas, se quiser, apresente perícia feita por órgão com notória credibilidade;
  6. Não há previsão (infelizmente) de prova testemunhal. Mas se admite a juntada de declarações de pessoas equiparadas a testemunhas que, no conjunto das provas, podendo operar em favor da tese invocada;
  7. Lembre-se que o julgador tributário que analisará a defesa, é um funcionário da Fazenda e, sem demérito algum, enxerga os argumentos sob a lente da sua experiência profissional o que impõe ao impugnante um exercício de linguagem mais atento a essa característica.

 

 

  1. O RECURSO ORDINÁRIO

 

Conforme artigo 47 da lei em debate, a peça recursiva ordinária é exclusivamente cabível ao contribuinte, ou responsável, que pretender questionar a decisão favorável à fazenda pública do Estado no julgamento da defesa em grau de 1° instância, seus requisitos estão previstos nos parágrafos do já mencionado artigo 47 da Lei 13.457/2009.

 

Destacamos como pontos que merecem especial atenção: (I) o prazo de 30 dias da ciência do decidido em grau de 1ª instância para sua interposição; (II) o débito fiscal exigido, na data da lavratura do AIIM, ser superior a 20.000 UFESP’s; (III) a admissibilidade a ser feita pelo Delegado Tributário de Julgamento; (IV) a devolução do conhecimento de matéria de fato e de direito.

 

Lembramos que para os débitos menores ou iguais a 20.000 UFESP’s, será cabível Recurso Voluntário dirigido ao Delegado Regional Tributário, nos termos do artigo 40 da Lei Paulista. Os requisitos para sua interposição vêm prescritivamente arrolados nos artigos 43 a 45 da Lei Paulista.

 

Seguimos estampando didaticamente alguns “pecados” que devem ser evitados na interposição e na condução dos trabalhos em ordinário apelo, a fim de maximizar as possibilidades de sua admissibilidade, conhecimento e análise de mérito. Os pecados a serem evitados são:

  1. Perda não motivada de prazo para interposição do Recurso;
  2. Repetição pura e simples da Defesa, sem questionar ou contradizer o decidido em 1ª instância, como se ela não existisse. É necessário “atacar” o já decidido;
  3. Não conhecer a linha de julgamento e eventuais posicionamentos dos integrantes da Câmara para situações semelhantes, seja por meio de votos anteriores, seja por meio de textos doutrinários e não apontar convenientemente possíveis vícios do decidido em 1ª instância, inclusive verificando se todos os fundamentos da “defesa” foram enfrentados. É “pecado mortal” não apontar, em ordinário, falhas no julgamento de 1ª instância.

 

  1. O RECURSO DE OFÍCIO

 

Cabe Recurso de Ofício a ser provocado pelo julgador tributário em face de suas próprias decisões de 1ª instância, contrárias à Fazenda Pública, nas condições elencadas nos artigos 39 da Lei 13.457/09, ocorre sob as seguintes condições: (I) endereçamento ao Delegado Tributário de Julgamento quando o débito fiscal exigido, na data da lavratura do AIIM, for menor ou igual a 20.000 UFESP’s; (II) o impugnante pode ofertar contrarrazões após manifestação da Representação Fiscal e (III) o recurso pode ser apreciado por quaisquer das três Delegacias de Julgamento.

 

Na hipótese de haver Recurso de Ofício e Recurso Voluntário da mesma decisão, temos que ambos serão julgados em comum pelo Delegado Tributário de Julgamento e que as contrarrazões do recurso de ofício e a interposição do recurso voluntário deverão ocorrer no prazo simultâneo de 30 dias da intimação ao contribuinte, conforme preleciona o artigo 41 da lei em comento.

 

O artigo 46 da Lei 13.457/09 trata do Recurso de Ofício de decisões de 1ª instância relativas a débito fiscal superior a 20.000 UFESP’s na data da lavratura do AIIM, nas seguintes condições: (I) endereçamento ao Tribunal de Impostos e Taxas; (II) o contribuinte pode ofertar contrarrazões após manifestação da Representação Fiscal e (III) o recurso será apreciado por uma das Câmaras de Julgamento.

 

Na hipótese de haver Recurso de Ofício e Recurso Ordinário da mesma decisão, ambos serão julgados em comum pelo Tribunal de Impostos e Taxas em uma de suas Câmaras de Julgamento conforme determina o artigo 48 da lei paulista, assim como as contrarrazões do recurso de ofício e a interposição do recurso ordinário deverão ocorrer no prazo simultâneo de 30 dias da intimação ao contribuinte.

 

Em qualquer dos casos a finalidade da regra é provocar o reexame necessário da matéria de modo que novos argumentos da própria Fazenda (ela é a titular desse tipo de recurso) possam provocar, no julgador tributário ou no juiz relator do TIT, uma revisão do que foi decidido, agora em seu favor. Alguns “pecados” do fisco a serem evitados são: (I) recorrer de situações não controvertidas em que a Fazenda já tenha sido vencedora e; (II) recorrer de matéria sumulada pelo TIT.

 

  1. O RECURSO ESPECIAL

 

O Recurso Especial é apreciado pela Câmara Superior do Tribunal de Impostos e Taxas, conforme prescrito nos artigos 42 e 49 da lei paulista que dispõe sobre o processo administrativo tributário.

 

Quanto à admissibilidade, é necessário que o recorrente (Fazenda ou contribuinte) traga à baila os atinentes fundamentos, e a indicação da decisão paradigmática, em que há mesma situação fática tenha recebido tratamento diferenciado nas Câmaras do Tribunal.

 

Lembramos que a divergência interpretativa só é possível quanto a situações fáticas que se submetam à mesma norma jurídica (a matéria em análise recursal e nos paradigmas destacados). Situações díspares não se prestam ao confronto. O Recurso Especial também resta imprestável para reanalisar provas, com intuito de alteração de situações fáticas consolidadas em grau de ordinário e não viciadas.

 

Considero que a etapa mais complexa do especial apelo é o seu conhecimento, onde o recurso admitido deve indicar precisamente as divergências interpretativas nele encontradas e dos processos tidos como paradigmas. Os principais “pecados” a serem evitados na interposição do Recurso Especial são:

  1. Perda de prazo injustificadamente;
  2. Ausência de indicação, juntada e cotejamento específico da situação recorrida e dos paradigmas ou não verificação, antes da juntada, de possíveis reformas dos processos tidos como paradigmais, ou apresentação de paradigmas fundamentados em legislação já revogada. Deixar passar a oportunidade de sustentar oralmente suas razões de recurso;
  3. Apoiar-se em argumentos meramente protelatórios, preliminares superadas, situações já sumuladas pelo TIT e alegações de inconstitucionalidades. Não dar importância à fase do conhecimento, porque sem sua superação todo o trabalho de tese jurídico restará inócuo.

 

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Esperamos que o artigo sirva de introdução aos que pretendem iniciar seus estudos sobre o tema que merece a máxima atenção.  Uma vez que o processo administrativo tributário vem validando-se como ferramenta menos custosa ao cliente, assim como a permite a possibilidade de submeter os apelos a um órgão julgador paritário formado por representantes dos contribuintes e do fisco, o que pode trazer mais igualdade para as contendas, restando ainda, de qualquer maneira, a via judicial para o embate, se assim desejar o contribuinte.

 

Por todo o exposto, percebe-se a suma importância de sempre apresentar defesas combativas, não esquecendo de nenhum dos itens de acusação presentes no auto de infração, bem como atentar-se a possíveis vícios na lavratura do mesmo, e, por fim, mas não menos importante, preocupar-se com os prazos, lembrando que, os detalhes podem favorecer a defesa.

 

De outro lado, evidencia-se que os argumentos meramente protelatórios, preliminares superadas, situações já sumuladas pelo TIT podem resultar em prejuízo, tornando a tese jurídico inócuo.

 

Por fim, conclui-se que Processo Administrativo Tributário Paulista regido pela Lei 13.457/2009 é importante instrumento de defesa da qualidade do lançamento fiscal. Não se trata de atividade jurisdicional – como muitos pretendem lhe atribuir – mas judicante, e com grau de definitividade para o contribuinte quando vencedor, haja vista que o Estado de São Paulo não pode recorrer ao judiciário quando vencido no TIT.

           

  1. BIBLIOGRAFIA

 

COMISSÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO OAB-SP. Contencioso Administrativo Tributário – Questões Polêmicas. São Paulo, Noeses, 2011.

 

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo, 11ª Edição. Malheiros Editores.

 

TOMÉ, Fabiana Del Padre. A Prova no Direito Tributário, São Paulo, 1ª edição, Noeses, 2005.

 

LEI 13.457/2009Dispõe sobre o processo administrativo tributário decorrente de lançamento de ofício, e dá outras providências.     

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