Compliance e Obrigações Acessórias no ICMS

Recuperação de Créditos e Questões Controvertidas
16/03/2021
Considerações sobre o Sistema Impugnativo e Recursal no Processo Administrativo Paulista Regido pela Lei 13.457/2009
16/03/2021
Recuperação de Créditos e Questões Controvertidas
16/03/2021
Considerações sobre o Sistema Impugnativo e Recursal no Processo Administrativo Paulista Regido pela Lei 13.457/2009
16/03/2021

Autor: CAIO AUGUSTO TAKANO. Advogado. Sócio no Takano Przepiorka Advogados. Juiz Titular TIT/SP e CMT/SP. Doutor e Mestre em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela Universidade de São Paulo – USP. Professor de Direito Tributário e Compliance Fiscal.

Coautoras: MARIA DANIELLE REZENDE DE TOLEDO. Advogada. Membro da Comissão de Direito Tributário OAB/ Campinas. Especialista em Direito Tributário pela Unicamp e Centro de Extensão Universitária – CEU.

PAULA VANESSA ROBATTINI DE BARROS. Advogada. Membro da Comissão de Direito Tributário OAB/Campinas. Pós-graduada em Direito Tributário pela PUC Campinas; em Direito Empresarial pela FGV; e pós-graduanda em Controladoria e Gestão de Tributos pela FIPECAFI.

 

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo analisar e tecer comentários e considerações a respeito de compliance e obrigações acessórias no ICMS, considerando, em especial, a legislação do Estado de São Paulo.

Sumário: 1. Introdução. 2. Compliance e Obrigações Acessórias. 3.Considerações Finais. 4. Bibliografia.

  1. INTRODUÇÃO

 

Iniciamos este artigo perguntando: Por que o compliance é importante no ICMS?

 

Antes de abordarmos o tema, é necessário entendermos que, atualmente, o papel do advogado não se restringe ao cumprimento de prazos e procedimentos, mas também a parte operacional da empresa, com uma análise crítica nas operações da empresa e no cumprimento das obrigações acessórias, pois, o descumprimento destas obrigações, e, até mesmo a cumprimento delas, impacta diretamente na defesa que será apresentada futuramente.

 

Portanto, o papel do advogado na chamada era digital – 4.0 não se restringe mais somente as funções elencadas acima, mas também, na identificação de riscos fiscais, acompanhamento do desempenho fiscal e do setor fiscal da empresa, geração de estratégias, estreitar relacionamento com o setor contábil, dentre outros.

 

Este último, se evidencia como um dos pontos mais importantes, pois estão atrelados e dependem um do outro para que seja desenvolvido um papel de excelência, tanto pelo contador, quanto pelo advogado, pois, na maioria dos casos, a tese abordada pelo advogado só terá sentido e força, se acompanhada dos documentos fiscais e contábeis fornecidos pela contabilidade.

 

Em se tratando de uma tese jurídica, o advogado precisará de documentos para conseguir comprovar e demonstrar seu direito! Contudo, se você não sabe onde você quer chegar, você não saberá quais documentos solicitar[1], e seu cliente será prejudicado.

 

Com base na abordado até agora, uma pergunta é pertinente: Você sabe o é compliance? E compliance para o ICMS?

  1. COMPLIANCE E OBRIGAÇÕES ACESSÓRIAS

 

O compliance, basicamente, é na verdade saber cumprir as regras. Sobre a mesma palavra há diversas realidades que podem ser aplicadas no âmbito trabalhista, ético, de responsabilidade civil, fiscal.

 

No tocante ao ICMS, o compliance está ligado as operações da empresa, a gestão do cumprimento das obrigações principais e acessórias[2], como, por exemplo: escrituração de livros, emissão de documentos, armazenamento destes documentos, dentre outros!

 

Nesse cenário nos questionamos: por que as obrigações acessórias importam?

 

A resposta não é simples, especialmente se levarmos em consideração: (i) os elevados custos para se manter na conformidade; (ii) elevadas multas por descumprimento de obrigação acessória, não sendo possível a denúncia espontânea, para corrigir eventuais erros em suas declarações acessórias, após o prazo legal; (iii) uma má gestão de obrigações acessórias ou uma política deficiente de compliance fiscal podem gerar consequências ou efeitos negativos ao vendedor/adquirente, nos novos programas de conformidade tributária; (iv) possibilidade de o Fisco utilizar as informações obtidas em novas obrigações acessórias[3] em fiscalizações/lançamentos que se refiram a períodos anteriores (últimos cinco anos), nos termos do art. 144, §1º do CTN, cruzando com outras informações de seus sistemas eletrônicos.

Especialmente no que tange ao Fisco Estadual, indispensável sopesar os efeitos negativos na negociação com fornecedores, de forma que o compliance de obrigações acessórias é de extrema importante para as empresas que pretendem se manter ativas e com poder de negociação e competitividade.

 

Hoje no estado de São Paulo temos 117 infrações referentes ao descumprimento de obrigações acessórias, acarretando a imposição de multas, que, muitas vezes é aplicada sobre o valor da operação. Em alguns, essas multas chegam ao percentual de 30% sobre a operação!

 

Atualmente, muito se fala do tempo gasto pelas empresas no Brasil no cumprimento das obrigações acessórias. Mas, o que é a obrigação acessória?

 

São deveres administrativos com função de: (i) instrumentalizar o cumprimento da obrigação tributária principal; ou (ii) atestar a inexistência de tributo nos casos de imunidade, isenção ou não-incidência.

 

De acordo com o professor argentino Héctor B. Villegas[4]: “(…) o fisco só pode desenvolver sua atuação de forma devida, se os particulares vierem a cumprir diversos deveres formais, de forma a transformar o tributo “legislativamente criado” em tributo “fisicamente percebido”.

 

Ou seja, quando se discute preenchimento de obrigação acessória[5] é importante conhecer como cumpri-las, e ainda, sua operacionalização e importância, principalmente, para análise e discussão no judiciário[6].

Para exemplificar a necessidade da gestão e cumprimento das obrigações acessórias, utilizaremos a nota fiscal! Via de regra, a nota fiscal deve refletir verdadeiramente as operações realizadas. Informações divergentes com relação a peso, transportadora, destinatário, CFOP, dentre outras poderão acarretar autuações e aplicação de multa elevadas.

 

Importante apontar alguns pontos que devem ser considerados quando da análise de uma nota fiscal, como, por exemplo: (i) número de série; (ii) destinatário/remetente, (iii) CFOP; (iv) campo de operações (NCM); (v) informações adicionais, dentre outros.

 

Todas as regras para emissão de nota fiscal devem ser observadas. Quando você emite a nota fiscal todos que possuem interesse na operação saberão o que aconteceu. Futuramente, todas as unidades federadas saberão o que aconteceu, por mais que não tenham interesse nenhum, mesmo que não ocorra no seu território!

 

Na prática, a empresa que negocia com notas fiscais está sujeita a determinadas situações, nas quais, o conhecimento das obrigações acessórias e seus requisitos são indispensáveis:

 

  1. Fornecimento de nota fiscal pelo fornecedor de forma equivocada (nota fiscal inidônea). A sua defesa neste caso estará baseada em verificar se a nota fiscal emitida é minimamente consistente; por isso a importância de ter o controle e conhecimento dos requisitos necessários para emissão e recebimento de nota fiscal. A inobservância de determinadas regras poderá acarretar a aplicação de penalidades para a empresa, que poderiam ser evitadas se o advogado (no momento da apresentação da defesa) ou o funcionário responsável pelo setor fiscal não tiverem conhecimento;

 

  1. A empresa emite nota fiscal e não percebe alguns detalhes na operação, como, por exemplo, o endereço de entrega constante na nota fiscal é um, e o adquirente pede para entregar em outro lugar. A empresa vai ser autuada e terá contra ela a aplicação de multa por remessa a destinatário diverso.

 

  1. Se preocupou com o transportador e ele fez uma mudança (redespacho) sem avisar a empresa. Ou seja, na nota fiscal consta um transportador e, na verdade, quem recebeu a mercadoria foi outro. A empresa provavelmente receberá uma multa por conter a nota fiscal atos inexatos.

 

Por isso é importante ter o conhecimento e saber aplicar o compliance para amenizar e evitar eventuais descumprimentos de obrigações acessórias que acarretam elevadas multas e prejuízos para a empresa.

 

  1. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

Compliance é isso!! Garantir a segurança jurídica e financeira da empresa! Saber que, embora a empresa tenha chance no judiciário, deve tomar medidas necessárias para tentar evitar uma “dor de cabeça”.

 

É necessário, e de extrema importância, que o advogado repense seu papel e a importância de possuir conhecimento no cumprimento das obrigações acessórias, pois será essencial para fazer valer o direito da empresa numa eventual defesa no judiciário, e até mesmo na via administrativa.

 

 

 

  1. BIBLIOGRAFIA

 

VILLEGAS, Héctor B. Curso de Finanzas, Derecho Financiero y Tributario. Editora Depalma, Buenos Aires: 2013, 9ª Edição.

 

Constituição Federal. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm >. Acesso em setembro de 2019.

 

Código Tributário Nacional. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172Compilado.htm >. Acesso em setembro de 2019.

 

Código de Processo Civil. Disponível em  < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm >. Acesso em setembro de 2019.

 

Regulamento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS – Estado de São Paulo. Disponível em  < https://legislacao.fazenda.sp.gov.br/Paginas/Home.aspx > . Acesso em setembro de 2019.

 

Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Disponível em < https://scon.stj.jus.br/SCON/ >. Acesso em setembro 2019.

[1] Nesse aspecto, importante ressaltar que o art. 195 do CTN autoriza a autoridade fiscal a requerer a exibição dos livros sem a necessidade de autorização judicial (art. 420 e 421 do CPC). Entretanto, é necessária ordem judicial para que se vasculhe o estabelecimento do contribuinte.

[2]Nesse contexto, necessário observar o comando normativo do art. 194 do Código Tributário Nacional:

Art. 194. A legislação tributária, observado o disposto nesta Lei, regulará, em caráter geral, ou especificamente em função da natureza do tributo de que se tratar, a competência e os poderes das autoridades administrativas em matéria de fiscalização da sua aplicação.

Parágrafo único. A legislação a que se refere este artigo aplica-se às pessoas naturais ou jurídicas, contribuintes ou não, inclusive às que gozem de imunidade tributária ou de isenção de caráter pessoal.

[3]Art. 195. Para os efeitos da legislação tributária, não têm aplicação quaisquer disposições legais excludentes ou limitativas do direito de examinar mercadorias, livros, arquivos, documentos, papéis e efeitos comerciais ou fiscais, dos comerciantes industriais ou produtores, ou da obrigação destes de exibi-los.

Parágrafo único. Os livros obrigatórios de escrituração comercial e fiscal e os comprovantes dos lançamentos neles efetuados serão conservados até que ocorra a prescrição dos créditos tributários decorrentes das operações a que se refiram.

[4] VILLEGAS, Héctor B. Curso de Finanzas, Derecho Financiero y Tributario. Editora Depalma, 1975.

[5] Sobre o regime jurídico das obrigações tributárias, indispensável a transcrição do art. 113 do Código Tributário Nacional, o qual dispõe:

Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.

  • 1º A obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.
  • 2º A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.

[6] Interessante análise sobre cumprimento de obrigação acessória por não contribuinte, é o representativo da controvérsia julgado no Superior Tribunal de Justiça:

“10. Isto porque, ainda que, em tese, o deslocamento de bens do ativo imobilizado e de material de uso e consumo entre estabelecimentos de uma mesma instituição financeira não configure hipótese de incidência do ICMS, compete ao Fisco Estadual averiguar a veracidade da aludida operação, sobressaindo a razoabilidade e proporcionalidade da norma jurídica que tão-somente exige que os bens da pessoa jurídica sejam acompanhados das respectivas notas fiscais.

  1. Consequentemente, não merece reforma o acórdão regional, tendo em vista a legalidade da autuação do contribuinte por proceder à remessa de bens (da matriz localizada em São Paulo para a filial da Paraíba) desacompanhados do documento fiscal pertinente” (in RECURSO ESPECIAL Nº 1.116.792/PB, 14/12/2010. Rel. Napoleão Nunes)
Pular para o conteúdo