O Administrador Judicial não é o Administrador da Recuperanda

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Dr. Felipe Marques Mangerona, membro da Comissão de Estudos em Falência e Recuperação Judicial

Há muito se diz que o legislador não foi feliz com a nova denominação dada ao Auxiliar do Juízo nos processos de Recuperação Judicial e Falências.

Isso porque a figura do Síndico e do Comissário, utilizada nos processos de falência e concordata, respectivamente, na vigência do Decreto-Lei 7.661/45, fora substituída pela do Administrador Judicial quando da introdução da Lei 11.101/05.

O preliminar estudo semântico da palavra “Administrador” pode induzir a erro diversos agentes, inclusive do meio jurídico, quanto às atribuições inerentes a esse Auxiliar da Justiça. De forma relativamente corriqueira, sobretudo no âmbito da Justiça do Trabalho, os Administradores Judiciais – sejam eles pessoas físicas ou jurídicas especializadas – são confundidos com os representantes legais e administradores da empresa que está em regime de Recuperação Judicial. Em muitas as situações, por vias obliquas, esses Auxiliares da Justiça são cadastrados no polo passivo de Reclamatórias Trabalhistas – como se devedores fossem –, recebendo citações e intimações, tanto em seu endereço profissional quanto em seu endereço residencial, para comparecimento à audiências e cumprimento de ordens de pagamento. Em casos mais extremos, há registros de indevidos bloqueios de bens dos Administradores Judiciais para satisfação da dívida da Recuperanda ou da Massa Falida.

O Administrador Judicial não representa em juízo, ativa ou passivamente, empresas em Recuperação Judicial, pois, de acordo com a redação do art. 64 da Lei 11.101/05, durante o procedimento de recuperação judicial, o devedor ou seus administradores serão mantidos na condução da atividade empresarial, sob fiscalização do Comitê, se houver, e do administrador judicial”.

As competências do Administrador Judicial estão esculpidas – em rol não taxativo – no art. 22 da Lei de Recuperação de Empresas e Falências, onde se prevê que este Auxiliar do Juízo apenas assume a representação judicial num ambiente de insolvência, na esfera do procedimento falimentar.

No mesmo viés, o Código de Processo Civil também regula a matéria em seu art. 75, V, dispondo que a representação processual é exercida pelo Administrador Judicial apenas quando a parte for Massa Falida, e não Recuperanda.

De todo modo, ainda que diante de uma situação na qual a falência já fora decretada, o patrimônio do Administrador Judicial não se confunde com o ativo da Massa Falida. Por mais óbvio que isso possa parecer àqueles que militam na área do direito empresarial, importantíssima se faz a clareza acerca das responsabilidades de cada um e a dicotomia dos operadores processuais: Administrador Judicial x Recuperanda ou Falida.

Apesar de o entendimento jurisprudencial também já estar consolidado quanto ao limite das incumbências do encargo da Administração Judicial, e mesmo após reiteradas Recomendações da Corregedoria do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, a exemplo da Recomendação CR 52/2009 e da Recomendação CR 63/2011, o repositório de situações nas quais tal Auxiliar do Judiciário foi indevidamente cadastrado como réu de ações judiciais envolvendo Recuperandas ou Massas Falidas  fez com que o Conselho Nacional de Justiça intervisse nessa celeuma para normatizar a matéria através do Pedido de Providências n° 0002765-85.2011.2.00.0000, pelo qual houve ordem expressa para “determinar aos Juízes do Trabalho de todo o país que atentem para o fato de que o Administrador Judicial (antigo síndico) da massa falida e o representante (comissário) da recuperação judicial (antiga concordata) são meros auxiliares do Juízo, e não sócios ou representantes legais da empresa, razão pela qual, em condições normais, não podem ser alvo de constrição patrimonial decorrente de débitos da massa.”

Desta forma, com o propósito de não ver perpetrar situações análogas, cada vez mais as palestras e cursos promovidos pelos profissionais e Institutos ligados à área da Recuperação Judicial e Falências, assim como é o caso do Ibajud, se mostram fundamentais à disseminação das melhores práticas e ao aprimoramento da matéria empresarial.

(Reprodução do artigo publicado originalmente pela Revista Insolvência) 

Filipe Marques Mangerona – Sócio Diretor da Brasil Trustee. Professor convidado do Instituto Brasileiro de Administração Judicial – IBAJUD, da Faculdade Autônoma de Direito de São Paulo – FADISP, da Escola Paulista de Direito – EPD e da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado – FECAP. Palestrante sobre temas ligados ao Direito Processual Civil e Empresarial. Especialista em Recuperação de Empresas e Falências pela Fadisp e em Direito Processual Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Autor de obras e artigos relacionados ao Direito Empresarial. Membro da Comissão de Estudos sobre Direito Recuperacional e Falimentar da OAB/Campinas e do Instituto Brasileiro de Administração Judicial – IBAJUD.

 

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